Enquanto não chegamos lá, reina a confusão na terra da acentuação. Em fóruns de programadores a gente vê muita gente perdida, procurando e oferecendo soluções baseadas mais em superstição e mitos do que em razão e fatos.
Este é o primeiro de uma série de posts para tentar esclarecer essa bagunça.
codificação: neste assunto, codicação não tem nada a ver com cifras ou código-fonte. Uma codificação é apenas uma forma de representar caracteres através de códigos numéricos, para armazenagem em computadores digitais.
A idéia errada: 1 caractere == 1 byte
A computação nasceu em países que falam inglês, um idioma onde se usam apenas as 26 letras de A a Z, sem acentos nem cedilhas [1]. Além disso, a memória das máquinas era muito limitada, então depois de alguma briga entre fabricantes americanos e usuários europeus se estabeleceu a idéia equivocada de que um byte corresponde a um caractere.
Essa idéia simplista gerou codificações como esta (clique na figura para ampliar):
Esta figura na verdade representa uma série de gambiarras, uma em cima da outra. Para começar, a faixa preta representa caracteres projetados para controlar um teletipo, um equipamento mais obsoleto até que um mimeógrafo. Por exemplo, o caractere '\x0C' [2], serve para avançar uma folha no papel e o '\x07' é o BELL, faz o teletipo tocar um sino para chamar a atenção do operador!
Apenas três destes caracteres de controle são largamente utilizados hoje: o HORIZONTAL TAB ('\x09'), o LINE FEED ('\x0a') e o CARRIAGE RETURN ('\x0d'). Os 32 caracteres de controle, bem como a faixa azul, formam o padrão ASCII (pronuncia-se ásqui, e não ásqui-2), totalizando 128 caracteres.
A faixa verde é a tabela ISO-8859-1, também conhecida como Latin-1, uma das várias tabelas de caracteres criadas na norma ISO-8859 para padronizar conjuntos de caracteres alfabéticos. Na tabela Latin-1 aparecem todos os caracteres usados nos idiomas da Europa ocidental. A mesma norma ISO inclui outras tabelas, como a ISO-8859-2 (Latin-2), para idiomas da Europa oriental (como Polonês, Tcheco e Húngaro) e a ISO-8859-5 que contém letras do alfabeto cirílico usado na Russia, Bulgaria, Sérvia etc. [3]
As duas fileiras vermelhas são um "puxadinho" feito pela Microsoft. A norma ISO-8859 reservava estas 32 posições para ainda mais caracteres de controle, que nunca "pegaram", então a Microsoft inventou um padrão chamado "CP-1252" [4] que é basicamente a combinação de ASCII com Latin-1 e mais 27 símbolos como o € (euro) o • (bullet) e as aspas assimétricas “assim” que tanto atrapalham a nossa vida de programadores.
Muitos aplicativos, especialmente no mundo Windows, alegam usar a codificação ISO-8859-1 mas na verdade usam CP-1252, violando a lei de Postel [5]. Isso causa alguma confusão porque se você tenta ler um arquivo CP-1252 como se fosse ISO-8859-1, seu programa não vai saber o que fazer com os €, •, “aspas” etc. Mas o inverso não causa problemas: você sempre pode ler um ISO-8859-1 como se fosse CP-1252, porque o primeiro é um sub-conjunto do segundo.
E o 氣?
Realmente não tem espaço naquela tabela para o caractere chinês do "qi" e os outros milhares de caracteres chineses, japoneses, coreanos, ou para dezenas de idiomas que não usam o alfabeto latino, como árabe, hebraico, tailandês e sânscrito. Essa constatação acabou com o princípio de que "1 byte == 1 caractere", e nos conduziu ao Unicode, tema do próximo post.
[1] na verdade, isso já é uma simplificação; qualquer dicionário de inglês tem a palavra façade (fachada), escrita assim mesmo, com cedilha; a palavra virou até um termo técnico em engenharia de software, pois é o nome de um dos padrões de projeto originais.
[2] \x0C é hexadecimal, em decimal seria 12
[3] a ISO-8859-1 (Latin-1) continua importante até hoje, mas a ISO-8859-5 "não pegou". Os russos preferem outros padrões, como KOI-7 ou KOI-8.
[4] conhecido também como "codepage 1252" ou oficialmente "Windows-1252"
[5] "Seja liberal no que aceita conservador no que envia". Procure "Postel Law" no Google e aprenda um princípio realmente importante e útil para a engenharia e para a vida em sociedade.
5 comments:
Pelo Post, você é professor também? Os meus de informatica só fala asneiras.. --'
Muito bom, Luciano! Eu gosto do tema, mas nunca tinha ido atrás de entender essa codificação do Windows. Esperando o resto da série... :)
Professsor sou professora do curso técnico em programação e uso python como referência estou precisando de material mas didático, que seja de fácil compreensão aos meus alunos, pois o curso é ao nivel técnico.
Meu Nome é Ana Paula do Ó
Meu e-mail: anacgpb@gmail.com
Professsor sou professora do curso técnico em programação e uso python como referência estou precisando de material mas didático, que seja de fácil compreensão aos meus alunos, pois o curso é ao nivel técnico.
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